Badalar o suicídio, explorar a tristeza da família, divulgar à carta derradeira e procurar teorias para o ato tem tomado conta dos periódicos. E não é só quando se trata de uma celebridade. Vide o caso do assassino de Realengo, cujos grandes portais da internet se transformaram no primeiro vídeo-blog in memóriam já feito. Mostraram tanto sobre o tal - fotos, vídeos, textos - que suas idéias desconexas angariou seguidores. O sensacionalismo criou pequenos monstrinhos. O assassino de Realengo apareceu, pra alguns, como um líder. Um líder que combateu o “bullyng”. Basta ver aqui
Rede de Intrigas (1976), de Sidney Lumet
Por falar em in memoriam: Sidney Lumet, falecido há duas semanas.
Howard Bale, o profeta pós-Watergate |
Li que muitos consideram Sidney Lumet, junto com Woody Allen, o cineasta que melhor filmou Nova York. Costumava mostrar o lado podre da cidade, o tal submundo. Mas, o filme em questão não se trata de Nova York. E sim, em como se tornar uma celebridade messiânica. Rede de Intrigas nos apresenta a um correto apresentador de telejornal, Howard Bale, que ao saber de sua demissão do programa, por conta do baixo indíce de audiência, tem um colapso nervoso ao vivo e anuncia que irá se suicidar. Ahn? Alguém ouviu o que ele disse? Ele disse que vai estourar os seus miolos? Tá no script do programa? O que fazer agora? Demissão? Como pode um discurso desse entrar nos lares americanos?
Na contramão de toda a bancada que pedia a cabeça do apresentador, uma voraz editora em busca do espetacular. Sim, a personagem de Faye Dunaway, quer chocar os espectadores. Não importa como. O que importa é o índice de audiência lá em cima e para que não haja traço, a idéia é explorar ao máximo a loucura do jornalista. Nada de informação precisa. O sensacionalismo suprime a informação. É a vitória do sensacionalismo. É a vitória da decadência moral da sociedade americana. Acostumados a assistir corpos putrefatos de seus “filhos” no Vietnã, agora, os lares, não tão doces assim, assistem às visões proféticas de um maluco. “Eu não agüento mais essa loucura” é o brado que se torna hit parade número um da moçada. Em tempos de Watergate, Vietnã e outras podridões, nada como um doido gritando, caindo no chão, erguendo as mãos aos céus e profetizando, para a sociedade americana adotar como novo herói da pátria.
Bale vira sucesso. Ganha um programa próprio, cheio de outros novos oráculos. O mercado de previsão do futuro inflacionou. Nunca a América profetizou tanto. Suas frases e visões não incomodaram a nova direção da emissora. Muito pelo contrário. Os bambambãs - leia-se Robert Duvall, interpretando alguém tão ganancioso quanto Dunway - continuaram explorando a audiência através do colapso de Bale. Por trás dos bastidores, há embates éticos e morais que nos fazem entender em como a imprensa chegou ao que é hoje. A figura da editora Diana (Faye) simboliza o que tende a se chamar de “Imprensa marrom”. O princípio básico de maquiável é a bússola orientadora da loira.
O sucesso de Bale, assim como qualquer outro tipo de sucesso, é sempre acompanhado da teoria gravitacional newtonniana, de que tudo que sobe, desce. A queda da audiência do programa, ocasionada por uma série de fatores, dentre eles os conflitos de interesse no próprio canal, derruba não só os índices do ibope. O final da obra de Lumet é a síntese de tudo o que aconteceu no filme. É como se fosse matéria de jornal, daqueles que se você espremer sai sangue. Através das últimas cenas você entenderá como, onde, quando e por quê o sensacionalismo na mídia está ligado a uma rede de interesses. E é inevitável não lembrar de Malcolm X (Filme biográfico sobre o líder negro e dirigido por Spike Lee), ao final de Rede de Intrigas.
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